Skateboarding, da marginalidade ao mainstream: a evolução da cultura das pistas desde os anos 60
Nascido da contracultura, o desporto se tornou movimento global e ferramenta de transformação social
Patti McGee
Pranchas improvisadas com rodinhas deram início a um movimento que cresceria muito além das expectativas dos seus primeiros praticantes, que buscavam uma alternativa para os dias sem ondas na ensolarada Califórnia, no fim dos anos 50.
Hoje, o skate influencia a moda, a música, o cinema e as artes visuais. As pistas proliferam em cidades ao redor do mundo, e muitas prefeituras já veem o desporto como uma ferramenta de inclusão social e revitalização urbana.
Para muitos skatistas, o esporte continua sendo mais do que medalhas e competições — é uma forma de ver o mundo, de se posicionar e resistir. Mas o skate se institucionalizou, foi pras Olimpíadas e atraiu patrocinadores.
Mulheres quebrando barreiras e construindo inclusão
Quando a cultura do skate começou a tomar forma, Patti McGee estava lá, tornando-se a primeira campeã nacional de skate feminino em 1965 e a primeira skatista profissional. A sua presença e a sua habilidade não só abriram caminho, como também mostraram que o skate não tinha género.
Depois, nos anos 70, quando a popularização das rodas de poliuretano revolucionou o desporto, surgiram os "Z-Boys" de Dogtown, transformando piscinas vazias em pistas de manobras e expressão artística. Entre eles, destacava-se uma única "Z-girl", Peggy Oki, que se tornaria um dos nomes mais influentes do skate vertical da época, provando que as mulheres podiam dominar as transições e os bowls com igual destreza.
Peggy Oki
Nessa fase inicial, a imagem do skatista estava longe de ser bem aceita, e a cultura do skate era marginalizada, associada à contracultura, à rebeldia contra padrões sociais e à ocupação de espaços urbanos públicos.
Ainda assim, no final da década de 70, a atriz Lynda Carter, que interpretava a Mulher Maravilha na TV, apareceu andando de skate em um episódio, ajudando a dissociar a prática da marginalidade.
Resistência e consolidação: a força feminina nos Anos Difíceis
Nas décadas seguintes, o skate sobreviveu e evoluiu, inclusive com o surgimento dos primeiros vídeos de skate, que contribuíram para difundir o desporto e estabelecer a sua linguagem visual e estética — atraindo marcas especializadas, revistas e competições. Tudo ainda à margem do mainstream.
Elissa Steamer
Mesmo em períodos de menor popularidade e visibilidade, mulheres como Cara-Beth Burnside persistiram, quebrando barreiras ao competir em eventos masculinos por falta de categorias femininas. Ela fez história ao ser a primeira mulher a aparecer na capa da revista Thrasher em 1989 e a ter um ténis de skate assinado pela Vans.
Na década de 1990, o skate urbano (street) ganhou força, com manobras mais técnicas realizadas em obstáculos da cidade. Elissa Steamer tornou-se um ícone da modalidade ao ser a primeira mulher a ter uma "parte de rua" num vídeo de skate importante (Welcome to Hell, 1996) e a única skatista profissional feminina jogável no Tony Hawk's Pro Skater original. As suas conquistas redefiniram o que era possível sobre quatro rodas para as mulheres, apesar do preconceito que ainda persistia.
Dos guetos às Olimpíadas: o boom e a inclusão social
Lisa Whitaker
A virada do milénio trouxe uma mudança significativa: grandes patrocinadores começaram a enxergar o potencial comercial da cultura do skate, que ganhava corpo e público em campeonatos no mundo todo. Organizações como a Girls Skate Network (fundada por Lisa Whitaker) e marcas focadas em skatistas femininas surgiram, oferecendo apoio e visibilidade cruciais. A pressão de atletas levou à inclusão de eventos femininos nos X Games a partir de 2003, impulsionando ainda mais a cena.
Sky Brown
Uma visibilidade que foi crescendo até culminar num marco histórico: a estreia do skate como modalidade olímpica nos Jogos de Tóquio, em 2021. A presença do desporto nas Olimpíadas trouxe respeito institucional e ajudou a quebrar o estigma que o acompanhava há décadas.
Nomes como as brasileiras Rayssa Leal (medalha de prata em Tóquio e um fenómeno global), Leticia Bufoni e a britânica Sky Brown tornaram-se estrelas internacionais, inspirando milhões e provando que o skate é uma ferramenta poderosa de inclusão social, oferecendo um espaço de autoexpressão, comunidade e superação para pessoas de todas as origens e géneros.
A expansão do mercado e o interesse das marcas
O mercado global de skate e do surf, que engloba equipamentos, vestuário, calçado e outros produtos relacionados, têm demonstrado um crescimento robusto.
Em 2024, a dimensão do mercado global de skate foi avaliada em 3,6 mil milhões de dólares, com projeções para atingir os 4,7 mil milhões de dólares até 2032.
A popularização do desporto e a sua entrada nos Jogos Olímpicos, em 2021, atraiu investidores diversos, para além das tradicionais marcas do skate, com patrocinadores não endémicos, que, através do skate, conseguem comunicar os seus valores e mensagens de forma autêntica a um público engajado.
Rayssa Leal