Curadoria de feeds: toma o controlo das tuas redes sociais

Criar filtros próprios não é isolar-se: é recuperar autonomia dentro de um ambiente programado para viciar

Por Isis Freitas

Vídeos, posts, anúncios, sugestões: um sistema de decisão que nós não controlamos. O algoritmo. Baseado em engajamento. Desenhado para manter a nossa atenção — não o nosso bem-estar. Senão era spa, não feed.

Quem tenta assumir o controlo do próprio feed — bloqueando palavras, silenciando temas, escolhendo o que quer ver — ouve logo: “Estás a viver numa bolha.” 

Mas o que é mais alienante: aceitar o que o algoritmo empurra ou criar, com intenção, um ambiente digital menos hostil?

Este texto parte dessa provocação. Para defender o direito de curar o que se consome. Para discutir os limites, os riscos, e a legitimidade de escolher o que entra — e o que não entra — no nosso campo de visão.

Controlo de danos

Curadoria algorítmica pessoal é o uso das ferramentas oferecidas pelas plataformas sociais para limitar o que aparece no feed. Em vez de aceitar passivamente o que é entregue, a gente define o que quer evitar — como posts sobre dieta, celebridade X ou criptomoeda — e o que prefere priorizar.

Isso pode incluir bloquear palavras, silenciar temas, ocultar perfis ou ajustar o que é exibido. Embora apresentadas como personalização, essas funções operam, na prática, como controlo de danos. Se o feed já entrega desinformação, pressão estética e ruído emocional em escala… vale, no mínimo, pensar no assunto.

Evitar gatilhos

A curadoria algorítmica pessoal começou como uma tentativa de reduzir o ruído. Entre mulheres, pessoas LGBTQIA+ e outros grupos mais expostos a assédio, pressão estética e conteúdo tóxico, filtrar o feed virou protecção — uma forma de respirar num ambiente que desgasta. Cortar palavras, silenciar temas, evitar gatilhos. 

Mas essa lógica pode servir a qualquer um. Há quem use para manter o foco, evitar crises de ansiedade, proteger o sono ou simplesmente não ver spoilers. Os feeds são diferentes. Os motivos também. E mesmo quem vive a alimentar o próprio desgaste — tipo quem diz que odeia o político X, mas vê todos os vídeos como se fosse série, ou quem detesta o jogador Y, mas segue compulsivamente — também podia beneficiar.

O feed não é neutro
É automático, vicia, desgasta. Mas parar também é algoritmo — teu. A crítica mais comum à curadoria pessoal é a de que ela cria bolhas — ambientes fechados, que evitam o contraditório e reforçam visões limitadas. Mas o filtro já existe. O feed não é neutro. 

A curadoria do que aparece — e desaparece — é feita pelas plataformas, com objectivos claros: manter o utilizador a rolar, clicar, comprar.


Não se trata de informar, proteger ou equilibrar. Trata-se de capturar atenção. E isso favorece conteúdos extremos, polarizadores ou emocionalmente carregados — não porque são relevantes, mas porque funcionam. Os critérios não são públicos. São definidos por equipas homogéneas, sob uma lógica guiada por interesses comerciais.

Você leu os termos de uso?
A experiência individual é moldada por decisões invisíveis que ninguém fora do sistema controla. Criar filtros próprios, neste contexto, não é isolar-se. É recuperar algum grau de autonomia dentro de um ambiente programado para viciar.

A mesma ferramenta pode servir à alienação ou à preservação. O que muda é o contexto, a intenção — e o nível de consciência de quem está a escolher. 

A maioria de nós já aceitou os termos de uso sem ler. Literalmente. E figurativamente também. Achando que ia ver uns vídeos de gato — e agora está no décimo carrossel sobre o colapso do mundo enquanto acompanha uma briga de comentários no perfil de um influencer de mentalidade milionária. Dissemos “aceito” a um feed que nos mostra o que quiser, quando quiser, do jeito que quiser — desde que a gente continue a rolar.

Fazer curadoria é, no fundo, começar a rever esse contrato. Não para cancelar a conta, mas para riscar umas cláusulas. Adicionar umas notas de rodapé. E, quem sabe, definir a parte que diz: “o que merece a nossa atenção antes que fritem o nosso cérebro.”

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